Neste capítulo abordamos os factores de risco e os factores protectores presentes no sistema escolar
enquanto contributos fundamentais para uma actuação promotora do desenvolvimento e sucesso dos
estudantes.
Investigações recentes evidenciam que existem inúmeros factores de risco e que quanto maior o seu
número no interior do sistema escolar, da família, do grupo de pares e da comunidade maior é a
probabilidade de encontrarmos uma rede de resultados negativos para os adolescentes tais como
abandono escolar, gravidez precoce, delinquência e comportamentos anti-sociais em geral.
Simultaneamente, outras investigações revelam que muitos indivíduos com condições de vida bastante
adversas conseguem ter sucesso tanto na escola como em outros aspectos da vida, o que pode ser
explicado através dos conceitos de factores protectores e de resiliência. Tais dados direccionam-nos para
uma perspectiva preventiva dos riscos em meio escolar.
1. Introdução
"A escola, concebida como espaço de transmissão de conhecimentos e de classificação dos níveis
da sua reprodução, raramente se preocupa em descobrir, valorizar e desenvolver as aptidões e
potencialidades que passam à margem do seu modelo de funcionamento" (Abreu, 2001, p.13)
O papel da escola e dos professores é actualmente entendido como sendo não só o de ensinar e promover
a aprendizagem e motivação dos alunos, mas também de apoiar o desenvolvimento global dos estudantes
tendo em vista o desenvolvimento futuro da sociedade. Tal consubstancia-se em quatro grandes pilares:
aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver com os outros e aprender a ser (Delors et al.
1998). Tal concepção da educação e do papel da escola traz para primeiro plano a necessidade de
promovermos uma educação que contribua activamente para o desenvolvimento harmonioso e autêntico
de cada indivíduo.
Se aceitarmos os anteriores objectivos enunciados como fundamentais, torna-se lícito interrogarmo-nos
sobre a sua concretização. Afinal quais serão os obstáculos com que a escola e outros sistemas se podem
confrontar e que podem tornar mais difícil a consecução de tais metas? E, pelo contrário, quais são os
aspectos que podem prevenir dificuldades e facilitar e contribuir para atingir tais objectivos? A investigação
sobre factores de risco, factores protectores e resiliência apresenta um contributo relevante para a
conquista de tais objectivos.
De uma maneira geral, os factores de risco são entendidos como as circunstâncias que podem aumentar a
probabilidade dos jovens se implicarem em comportamentos de risco. Pelo contrário, os factores
protectores constituem-se como quaisquer circunstâncias que promovem comportamentos saudáveis e
diminuem a possibilidade dos jovens se envolverem em comportamentos de risco. O conceito de factores
de risco surge nos anos 80 baseado na pesquisa que identifica as condições subjacentes a diversos
comportamentos considerados socialmente problemáticos, tais como uso de drogas e álcool, gravidez
precoce, delinquência, violência e abandono escolar. Numa perspectiva sistémica, tais condições não são
entendidas em termos de causa-efeito, mas sim como algo que potencia que os indivíduos se envolvam
em tais comportamentos.
Os factores de risco existem a nível individual e a nível dos sistemas de que o sujeito faz parte, tais como o
grupo de pares, a família, a escola e a comunidade (Hawkins, Lishner & Catalano, 1985). São
precisamente as características de cada um destes domínios que moldam as experiências de vida da
pessoa e influenciam os seus comportamentos, pelo que se torna importante que tais características se
revistam de aspectos positivos de forma a constituir-se como factores protectores facilitadores do
desenvolvimento saudável dos indivíduos.
Na verdade, enquanto uma focalização nos riscos arrasta consigo uma postura reactiva, i.e., uma
intervenção após o aparecimento dos problemas, uma focalização nos factores protectores permite a
mudança de foco do que está mal para o que pode ser feito para facilitar o desenvolvimento de
comportamentos e atitudes saudáveis.
Actualmente, os factores protectores são entendidos como recursos pessoais, sociais e institucionais que,
promovendo formas de resiliência na juventude, facilitam o desenvolvimento bem sucedido do
adolescente atenuando os factores de risco que de outro modo poderiam comprometer esse
desenvolvimento (Bernard, 1991; Garmezy & Rutter, 1985). Por outro lado, a resiliência é considerada
como a capacidade para sair ou para resistir a múltiplas condições adversas ou para ultrapassar
desvantagens (Garmezy, 1985; Rutter, 1987; Seligman, 1995; Werner, 1988; Wolin, 1993).
A resiliência pode pois ser considerada como a capacidade para atingir uma saudável competência
emocional e social apesar de um historial de adversidade ou stress (Anthony & Cohler; 1987; Garmezy,
1985; Werner & Smith, 1982). Neste sentido, por exemplo, para as crianças ou jovens que experienciam
situações adversas nos seus contextos de vida ter um professor eficaz e um meio escolar apoiante pode
frequentemente significar a diferença entre ter sucesso ou falhar na vida (Haberman, 1996). É pois
extremamente importante que os professores compreendam o fenómeno da resiliência, sejam capazes de
identificar as características que ajudam a proteger as crianças e jovens de stressores ambientais e
compreendam como podem criar meios académicos apoiantes e ricos.
Para prevenir riscos é necessário olhar para as causas subjacentes aos fenómenos em causa. Tais causas
são por nós entendidas como situadas algures na dinâmica relacional entre factores de risco e factores
protectores. O estudo destes constructos (i.e., factores de risco, factores protectores e resiliência), pode
promover um novo olhar e uma nova actuação no contexto escolar. Actuação essa que, ao debruçar-se
sobre formas de evitar ou atenuar comportamentos de risco traz para primeiro plano a necessidade de
uma intervenção de carácter pró-activo que muda substancialmente a forma de encarar o papel da escola
e da própria sociedade.
2. Factores de risco e factores protectores no contexto de vida das crianças e jovens
Os factores protectores e de risco são variáveis pessoais e contextuais que influenciam padrões
desenvolvimentais transformando-os em resultados positivos ou negativos para o indivíduo. Enquanto os
factores de risco aumentam a vulnerabilidade dos indivíduos, pelo contrário, os factores protectores
actuam protegendo-os do impacto negativo de certas experiências e circunstâncias.
Os estudos iniciais sobre factores protectores e de risco permitiram duas descobertas interessantes:
1) Que certos tipos de experiências de vida se encontram correlacionadas com o aumento/diminuição do
risco para as crianças e jovens.
2) Que existem diferenças individuais na forma como cada um responde a circunstâncias adversas.
Os factores protectores e os factores de risco são também entendidos como algo que potencia que os
indivíduos se envolvam ou não em comportamentos saudáveis ou promotores de desenvolvimento, o que
é actualmente entendido como decorrente dos vários sistemas que rodeiam o indivíduo (família, escola,
grupo de pares e comunidade) e não somente de um deles. Existem então duas questõeschave a que as
investigações neste âmbito tentam responder, ou seja, quais são os factores de risco e quais os factores
protectores existentes nos vários domínios que rodeiam o indivíduo?
Se pensarmos numa criança ou jovem em desenvolvimento, conseguimos identificar e compreender
claramente os domínios que os podem influenciar de forma mais ou menos directa, i.e., o grupo de pares, a
família, a escola e num sentido mais amplo a própria comunidade. Passaremos a analisar cada um destes
domínios assim como os factores de risco e factores protectores em cada um dos mesmos.
No que se refere ao grupo de pares, constituem-se como factores de risco as atitudes de rejeição e
alienação por parte do jovem, a existência de amigos com comportamentos problemáticos, a rejeição
pelos pares, as competências sociais pouco desenvolvidas, uma atitude favorável face a comportamentos
problemáticos e uma iniciação precoce em comportamentos problema. Pelo contrário, num temperamento
resiliente, o envolvimento em actividades sociais, a aderência a normas de pares positivas e a posse de
competências sociais desenvolvidas (na tomada de decisão, assertividade e comunicação social),
revelam-se como factores que protegem os jovens do impacto de certas circunstâncias negativas
contribuindo para evitar a emergência de comportamentos de risco.
Em termos familiares, a existência de conflitos, de problemas de gestão da família e de um historial ligado a
comportamentos problemáticos são alguns dos riscos a que o jovem pode estar exposto. Por seu turno, a
existência de uma ligação afectiva segura, de crenças familiares saudáveis e de normas de
comportamento claras, actuam como factores protectores.
Na escola, o insucesso académico e problemas de comportamento precoces, a falta de afiliação e
envolvimento na vida institucional, as baixas expectativas do professor, a ausência de orientações claras e
um clima negativo, desordenado e inseguro constituem-se como os principais factores de risco para os
jovens. Por seu turno, a existência na escola de oportunidades para o jovem se envolver em actividades,
responsabilidades e decisões, o reconhecimento e recompensa de comportamentos e realizações prósociais,
crenças saudáveis, um ambiente interessado e apoiante, altas expectativas face ao
jovem/estudante e padrões claros de normas e de comportamentos adequados, revelam-se como
factores protectores do sistema escolar.
Igualmente no que concerne à comunidade envolvente encontram-se identificados factores de risco e
factores protectores. A existência/inexistência de drogas de fácil alcance e também o fácil acesso a armas,
o tipo de leis, normas e organização da comunidade tais como o tipo de ligação com a vizinhança e as
condições económicas podem actuar num ou noutro sentido.
De um modo geral, as investigações realizadas permitem concluir que:
- Quanto maior o número de factores protectores existente nos diversos sistemaschave que afectam a
criança/jovem mais provável se torna que eles desenvolvam resiliência.
- A promoção dos factores protectores reduz os riscos de uso de drogas, suicídio, insucesso ou abandono
escolar (Adelman, 2005), comportamento violento ou disruptivo (Borowsky, Ireland, Resnik, 2002) e
gravidez precoce.
- As escolas têm um importante impacto no desenvolvimento das crianças e jovens. As suas
características institucionais actuam criando um conjunto de valores, atitudes e comportamentos que se
traduzem em traços particulares da sua organização e funcionamento criando um determinado clima ou
cultura que favorece resultados mais ou menos positivos para os jovens que as frequentam (Rutter,
1982).
3. A escola e a aposta em alguns factores protectores chave
A escola é um espaço privilegiado de interacção, promoção do desenvolvimento, instrução e cultura onde
os jovens passam cada vez mais tempo e que exerce uma influência determinante ao nível das
experiências que lhes proporciona. Tais experiências podem concorrer para a exposição dos jovens a
situações mais ou menos positivas, que actuam respectivamente como factores de protecção ou de risco.
É pois importante reflectir sobre os factores protectores proporcionados pela escola, de forma a delinear
uma intervenção preventiva e pró-activa que fortaleça a sua presença em contexto escolar.
A literatura sobre factores protectores revela que embora diferentes autores se refiram aos factores
protectores utilizando diferentes termos, todos eles se referem a três factores protectores que emergem
como centrais: o interesse, suporte ou apoio, as expectativas elevadas de que o jovem é alvo e as
oportunidades para participação efectiva que lhe são proporcionadas.
Passaremos agora a analisar cada um destes factores protectores em contexto escolar de modo a
compreendermos mais profundamente o seu significado e as mudanças e implicações necessárias se os
quisermos incrementar verdadeiramente.
A) Interesse e Apoio
Um dos principais factores protectores é o interesse e apoio que o jovem experiencia nos seus contextos
de vida. Manifestar interesse e apoio passa por estarmos disponíveis para ouvir sem julgar, reassegurar o
jovem, mostrar bondade, ajudar a gerir possíveis soluções para problemas pessoais ou académicos,
expressar alegria por termos estado na sua companhia, incrementar trabalho cooperativo e compreender
que por vezes a relação é a de um adulto que dá e de uma criança ou jovem que recebe. No entanto,
afigura-se também como parte fundamental deste interesse e apoio o exercício por parte do adulto de um
papel normativo junto do jovem que englobe supervisão, autoridade e disciplina. Investigações realizadas
mostram que para as crianças o modelo mais positivo fora da escola é um professor favorito que não se
constitui apenas como um "instrutor", mas também como um modelo de identificação e alguém em que
elas confiam (Garmezy e Rutter, 1983;Werner e Smith, 1982; Zimmerman e Arunkumar, 1994).
Que condições pode a instituição escolar criar para aumentar a probabilidade dos jovens experienciarem
este interesse e apoio? Para respondermos a esta questão convém lembrar-nos que todos os elementos
presentes na escola, i.e., auxiliares de educação e restante pessoal, professores, direcção e pares, fazem
parte da rede relacional do jovem.
Até à data tem sido frequente o esquecimento do papel relevante que o pessoal não docente desempenha
ou pode desempenhar em termos relacionais. De facto, este pessoal encontra-se em momentos e
espaços-chave da vida dos jovens na escola, ou seja, antes das aulas começarem ou nos intervalos, no
final das aulas e enquanto os jovens não apanham o transporte para casa. O interesse e apoio aos jovens
pode ser em parte proporcionado pela existência de pessoal auxiliar de educação próximo, estimulante e
que se constitua como modelo de referência positivo. A este respeito interrogamo-nos sobre se a escola já
incorporou efectivamente uma visão deste tipo de agentes enquanto auxiliares de acções educativas e
desenvolvimentais e também sobre que acções nas nossas escolas são deliberadamente realizadas
neste sentido.
Já no que concerne aos professores é unanimemente aceite que a atenção personalizada e o interesse
pelos alunos é fulcral. A criação de um clima caloroso e apoiante na turma e na escola, em que se comunica
interesse, cuidado e atenção pelos estudantes actua como um factor protector que os ajuda a permanecer
na escola. Faltará ainda, talvez, não só uma maior consciência de que tal aspecto se constitui como um
factor protector crucial, mas também a pesquisa de formas e espaços de o garantir a todos os alunos.
A liderança da escola pode também concorrer para a promoção do interesse e apoio se as suas práticas
forem criativas, de suporte e de cooperação. Um clima de escola caloroso e compreensivo e um corpo de
professores que age em conjunto, quer no que concerne ao currículo quer acerca da forma dos estudantes
se comportarem, apresentam um forte impacto positivo não só no desenvolvimento dos jovens, mas
também na sua assiduidade e comportamento (Rutter, 1982).
Por último, abordaremos a relação entre pares. Como sabemos, nestas faixas etárias os grupos de pares
assumem significativa importância e influência sobre os jovens. A este nível, são as relações marcadas
pelo apoio, aceitação e cooperação que funcionam como factores protectores. Em contexto de sala de
aula tal pode ser incrementado através de metodologias e práticas colaborativas e no contexto escola
através do mentorado, ou seja, da existência de pares que funcionem como conselheiros ou guias.
B) Expectativas elevadas
O efeito das expectativas dos professores sobre os alunos está já bem demonstrado revelando a
existência de profecias que se auto-cumprem, ou seja, de expectativas que se tornam realidade somente
porque se esperam. Tais expectativas por parte do professor podem não ter uma base concreta ou, pelo
contrário, ser muito precisas e corresponderem a uma estimativa, mais ou menos real, do nível de
capacidade/realização do aluno. No primeiro caso, o problema é que as crenças erróneas do professor
acerca das habilidades ou condutas dos estudantes dão origem a condutas por parte do aluno idênticas às
esperadas pelo professor (efeito Pigmalião ou profecia auto-cumprida). No segundo caso, o problema
existe quando os estudantes apresentam alguma melhoria, mas os professores não alteram as suas
expectativas e portanto não a têm em consideração (efeito da expectativa sustentada), perdendo-se assim
a possibilidade de surgirem novas expectativas, de se proporcionar ensino-aprendizagem mais adequado
e fomentar um melhor desempenho do estudante (Cooper, 1979; Cooper & Good, 1983).
Esperar o sucesso de todos os alunos e docentes, evitar a etiquetagem negativa, enfatizar aspectos
académicos de ordem mais elevada, interferir minimamente em relação a competências básicas e
fornecer apoio a todos os estudantes com vista ao sucesso, surgem na literatura como os principais
factores protectores neste âmbito.
É aparentemente fácil compreender os benefícios de tais métodos, mas muito mais difícil colocá-los de
facto em prática. Por questões de parcimónia, gostaríamos somente de chamar a atenção para duas
questões. Uma delas prende-se com a necessidade dos professores serem eles próprios alvo de
expectativas positivas e elevadas, o que poderia começar por ser feito pelos próprios pares e pela
liderança da escola. A outra, prende-se com o facto de, por vezes, se estimular pouco certos alunos já que,
pensando o professor que o aluno não é capaz, evita colocar-lhe questões ou solicitar-lhe tarefas um
pouco mais complexas. Como vimos, tal atitude constitui um erro que decorre de baixas expectativas e que
pode tornar-se um obstáculo ao desenvolvimento e competências do aluno.
C) Oportunidades para participação significativa por parte da comunidade, pais e estudantes
A participação dos pais e da comunidade na instrução; a participação dos estudantes não só em
actividades significativas como também na liderança e tomada de decisões através da atribuição de
responsabilidades e de papéis que o permitam; o encorajamento da participação dos estudantes em
actividades extra-curriculares; curricula e experiências culturalmente diversificados e a valorização das
contribuições dos estudantes são apontados como factores protectores a incrementar nas escolas.
Embora a ideia da importância da participação pareça começar a ser aceite pelas nossas escolas,
verificamos a existência dificuldades na sua implementação que se prendem com uma necessária
mudança de mentalidades e com a construção de uma cultura escolar ainda longínqua em termos
nacionais.
4. Escola, estudantes em risco e resiliência
Podemos considerar como estudantes em risco os jovens que têm alta probabilidade de falhar na
aquisição de competências académicas mínimas e necessárias para serem bem sucedidos no mundo
adulto. Aqueles que abandonam a escola apresentam frequentemente uma história de insucesso
académico, maior idade que os colegas da turma, problemas emocionais e comportamentais e falta de
envolvimento e comprometimento com o contexto escolar. É de notar que o abandono escolar apresenta
várias formas e surge amiúde muito tempo ou anos antes da sua ocorrência oficial.
Retenções sucessivas, notas baixas, excessivos atrasos ou absentismo, suspensões repetidas pelas
mesmas infracções, vandalismo escolar, escasso envolvimento nas actividades da escola, baixa autoestima
e falta de ligação com professores e pares são alguns dos indicadores deste processo progressivo
que, a pouco e pouco, conduz ao abandono da escola e ao acentuar da incerteza face ao futuro do jovem
(Lindenberger/SAPE, 2004).
Estes jovens abandonam a escola por várias razões possíveis das quais salientamos três: escasso apoio
ou encorajamento da família, circunstâncias de vida difíceis (saúde, trabalho ou gravidez), insatisfação
com a escola (dificuldade em acompanhar a matéria; considerar e experienciar o ambiente como inseguro,
perigoso ou restritivo; ver o currículo como aborrecido e irrelevante para as suas necessidades) e atitudes
por parte dos professores que traduzem desinvestimento no jovem ou configuram recomendações bem
intencionadas para este seguir alternativas de ensino mais fáceis. De facto, embora isso possa em certos
casos ser adequado, em outros casos está-se efectivamente e sem querer a confirmar no estudante as
suas próprias expectativas, "dizendo-lhe" que não pertence ali em vez de se lhe proporcionar o suporte e
apoio necessários para ser melhor sucedido.
Apesar do grupo de estudantes em risco constituir um grupo diversificado e com diferentes necessidades,
segundo Lindenberger (2004) para ajudar estes jovens a permanecer na escola é fundamental:
A) Identificar o mais cedo possível os estudantes em risco.
B) Criar um clima caloroso e apoiante na turma e na escola e comunicar interesse, cuidado e atenção.
C) Tornar o currículo relevante para os seus valores culturais, experiências de vida e necessidades
pessoais.
D) Comunicar altas expectativas de sucesso académico, ou seja, comunicar que o sucesso é possível e
expectável, que os alunos são capazes de o obter e que os ajudaremos a adquirir as competências de que
precisam fornecendo-lhes ao mesmo tempo formas concretas de ultrapassar as dificuldades.
E) Fornecer o máximo da instrução dentro do contexto da educação normal e também apoio académico
extra. Por exemplo, na leitura e estratégias de aprendizagem, adaptando a instrução às suas
competências e conhecimento, fornecendo tarefas estruturadas e dizendo exactamente o que se
pretende, desenvolvendo a mestria numa dada competência antes de passar à seguinte, avaliando
frequentemente os seus progressos e dando-lhes critérios para eles próprios os medirem.
F) Mostrar aos estudantes que são eles próprios que tornam o seu sucesso possível ajudando-os a
reconhecer que eles são responsáveis pelo seu sucesso, a atribuírem os seus sucessos/fracassos ao
esforço e trabalho desenvolvidos e aumentar o seu sentido de auto-eficácia.
G) Encorajar e facilitar a identificação com a escola, nomeadamente através do seu envolvimento nas
actividades sociais da mesma.
Podemos no entanto interrogarmo-nos sobre a razão porque apesar de tudo algumas crianças e jovens
com contextos de vida marcados por grandes desvantagens conseguem ser bem sucedidos. É
exactamente esta a questão que se encontra na origem da investigação levada a cabo sobre factores
protectores, os quais não só amortecem os riscos como suportam o desenvolvimento da resiliência.
A pesquisa no âmbito da resiliência partiu de teorias da resiliência enquanto traço, focalizando-se no
desenvolvimento da competência e confiança dos indivíduos perante o risco e a adversidade (Werner &
Smith, 1992). Progressivamente, a resiliência começou a ser entendida como um processo
desenvolvimental dinâmico. Assim, a investigação começou interessar-se pela descoberta das relações
entre factores de risco e resiliência e pela identificação das condições que melhor neutralizam ou atenuam
os riscos desenvolvendo resiliência (Constantine, Benard & Diaz, 1999).
Todos os seres humanos apresentam três necessidades básicas: a necessidade de competência, a
necessidade de autonomia e a necessidade de relação ou ligação, que reflecte a necessidade de nos
sentirmos ligados a outrem de forma segura, experienciando-nos como seres portadores de valor
simultaneamente amados e capazes de amar (Connell, 1990, citado por Cooper, Hooper & Thompson,
2005). Ora, a resiliência aumenta na extensão em que tais necessidades são satisfeitas. Os factores
protectores constituem-se pois como os aspectos que aumentam a resiliência da criança ou jovem face a
stressores. Como já antes acentuámos, é a dinâmica entre os factores de risco e os factores protectores
que determina se o jovem ultrapassa ou não os stressores que enfrenta.
Os indivíduos resilientes têm sido descritos como tendo expectativas saudáveis, sentido de optimismo,
locus de controlo interno, capacidade de resolução de problemas, auto-disciplina e sentido de humor
(Garmezy, 1985, Rutter, 1979; Seligman, 1992; Werner, 1988; Wolin, 1993). De uma forma geral, são
ainda identificados como atributos de resiliência a competência social, a autonomia e independência e o
sentido de objectivo e de futuro (Benard, 1991).
No âmbito das competências sociais, a sensibilidade e compreensão, flexibilidade, empatia e interesse
pelos outros e competências de comunicação desenvolvidas parecem ser factores protectores cruciais.
Por seu turno, no que diz respeito a competências de resolução de problemas, parece ser fundamental
desenvolver a capacidade de pensar abstractamente, de forma reflexiva e flexível, dirigida para a procura
de soluções alternativas de problemas cognitivos e sociais.
Quanto à autonomia e independência, esta passa pelo sentido da própria identidade e pelo
desenvolvimento da capacidade para agir de forma independente exercendo algum controlo sobre o meio.
Por fim, o sentido de objectivo e futuro inclui expectativas saudáveis, direccionamento para objectivos e
crença num futuro positivo.
Deverá a escola actuar de forma a desenvolver tais competências nos seus estudantes? Na prática terá
meios para o fazer? Será ou não função da escola contribuir para o desenvolvimento integral e saudável do
jovem, das suas competências sociais, da resolução de problemas, autonomia e ajuda à construção de
projectos de vida e profissionais? Se a resposta for afirmativa, então a escola não pode continuar a deixar
tais aspectos a descoberto de uma acção planificada, sistematizada e intencional. Uma tal actuação passa
por activar equipas de colaboração, que não só identifiquem recursos para combater os factores de risco
prioritários, mas também implementem acções que promovam factores protectores na escola (e
desejavelmente também a nível individual e dos pares, da família e da própria comunidade).
Embora a resiliência possa ser entendida como a capacidade para o indivíduo se desenvolver e ser bem
sucedido apesar da adversidade, mesmo com atributos de resiliência actuando como amortecedores a
verdade é que esta é fortemente influenciada não só pelos acontecimentos de vida que enfrentamos, mas
sobretudo pela forma como com eles negociamos. Compreender isto e estimular essa negociação é no
fundo a base de uma atitude preventiva que convém implementar mesmo na ausência de risco declarado.
Na escola, sem dúvida, mas também na vida em geral.
5. Conclusões
Partilhamos da ideia de Hodkinson (1991) de que antes de procedermos a mudanças na escola
nos devemos questionar não só sobre o que pode a escola fazer para reduzir o número de
crianças e jovens em risco permitindo-lhes ser bem sucedidas em contexto escolar, mas também
como pode a instituição escolar colaborar mais de perto com outros serviços para, em conjunto,
trabalhar com vista à redução dos riscos e à promoção de factores protectores nos contextos de
vida das crianças e jovens.
Construir um novo olhar sobre a própria escola e os estudantes, pensar que é possível actuar de forma
mais eficaz, usar a informação sobre factores de risco para os identificar e avaliar a capacidade da escola
para os amortecer e para promover factores protectores, prestar mais atenção às forças positivas e
capacidades dos jovens, apoiar a construção de competências preditoras de resiliência (e.g., eficácia no
trabalho, diversão, amor, expectativas saudáveis, olhar positivo, auto-estima e locus de controle interno,
auto-disciplina, competências de resolução de problemas e pensamento crítico) constituem-se como
formas de implementar novas práticas potenciadoras de sucesso, bem-estar e saúde mental.
Por um lado, os professores deveriam ser preparados para identificar factores de risco, protectores e de
resiliência nos estudantes e na escola de forma a poderem começar a delinear e implementar
deliberadamente estratégias de actuação nestes domínios. Por outro, ao mesmo tempo que a escola deve
compreender que uma actuação eficaz no que concerne aos factores de risco e protectores envolve a
actuação conjunta com outros serviços, deve também compreender que tem amplas responsabilidades e
muito a fazer neste domínio.
As recomendações que decorrem da literatura sobre factores de risco, factores protectores e resiliência
são úteis a qualquer estudante, revelando a pesquisa que os programas mais efectivos para os estudantes
em risco são aqueles que incorporam práticas correctas e "normais"de educação (Slavin et al. 1989).
Não podemos afirmar que os riscos causem comportamentos negativos e que os protectores os previnem.
Podemos sim afirmar que factores de risco e factores protectores se encontram relacionados e que
múltiplos factores ambientais estão relacionados com os comportamentos dos estudantes actuando sobre
eles de uma forma sistémica (Adelman, Harrison, & Hedger, 2000). Desta forma, se queremos aumentar a
eficácia das intervenções estas devem ter como alvo diferentes domínios e adoptar diferentes estratégias.
Por outro lado, nem os riscos nem os factores protectores devem ser examinados de forma isolada. A
verdade é que grande parte dos indivíduos sente o efeito de ambos os tipos de factores na sua vida pelo
que a combinação dos dois na vida de cada um pode ser mais importante do que o número absoluto de um.
De uma maneira geral, pode afirmar-se que um estudante com elevados riscos apresenta menos
probabilidades de ter comportamentos negativos se também puder sentir a influência de alguns
protectores. Isto significa que os factores protectores devem ser fortalecidos deliberadamente para
amortecer ou neutralizar os efeitos dos riscos. A escola pode pois desempenhar um papel relevante ao
intervir não só de forma reactiva perante os problemas já declarados, mas também de forma preventiva e
pró-activa ao actuar no sentido da diminuição dos riscos e da promoção de comportamentos positivos,
fortalecendo factores protectores dentro do sistema escolar. Tal implica acreditar que temos o poder para
criar um meio que não só protege as crianças e jovens, mas também alimenta e desenvolve forças internas
de confrontação com obstáculos, i.e., resiliência.
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