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Um gato debaixo do pinheiro de Natal

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  — O gato cinzento está com mau aspecto — observa Laura, empoleirada no alto do pequeno muro que separa o jardim do baldio. Mas o pai está a cortar a sebe e não ouve o que ela diz.

   — O gato cinzento está com mau aspecto; acho que está doente… — insiste ela.

   A mãe não ouve, ocupada também a arrancar as ervas do passeio, o que Laura, aliás, também devia estar a fazer para a ajudar.

   Então Laura repete para si, em voz baixa e grave:

   — Parece que o gato cinzento vai morrer.

   O gato sem nome nem casa tem o pelo descaído e o salto lento; não liga aos pássaros, já não tem fome, foge do sol e abriga-se entre dois pés de urtigas.

   — É preciso chamar o veterinário — sugere Laura.

   — Nem penses! Ele tem mais que fazer do que tratar os gatos vadios.

   Desta vez, a mãe sempre resolvera responder.

   — Não é vadio, porque eu acolhi-o e gosto dele — retorquiu Laura.

   Laura só faz o que lhe apetece. Amanhã, a caminho da escola, vai bater à porta do veterinário, como fez da outra vez por causa de um passarinho caído do ninho e de um ouriço-cacheiro meio esmagado por uma bicicleta. É um veterinário idoso muito simpático, que não a manda dar uma volta.

   "Amanhã vou esconder o gato na minha pasta, está decidido."

   No dia seguinte, não consegue encontrar o gato em lado nenhum e são já mais que horas de ir para a escola. Laura vai então sem o gato. Bate à porta do veterinário para pedir um conselho.

   Mas é a mulher que vem à porta e lhe dá uma resposta seca:

   — O meu marido está inundado de trabalho.

   "Inundado"? O rio inunda as terras; a banheira, quando demasiado cheia, inunda o quarto de banho… mas um veterinário "inundado"? Então, quem há-de aconselhar Laura? Não quer que se riam dela, não quer ser motivo de troça.

   Durante o recreio do meio-dia, Laura escapuliu-se do pátio. Se a professora soubesse! Se a mãe a visse! Laura sabe que pode ser suspensa por três dias: "Que falta de responsabilidade!". Ela bem sabe, mas o gato cinzento está com tão mau aspecto...

   Que surpresa! É um rapaz novo que vem atender.

   — O meu pai vai aposentar-se e sou eu que vou substitui-lo — explica com gentileza, ao ver o espanto de Laura.

   Ela gaguejou ao falar do gato e o veterinário compreendeu num ápice:

   — Esta tarde, Laura, não tenho muito trabalho, e por isso vou dar uma volta para esse lado.

   Depois das quatro horas, ao regressar da escola, Laura encontrou um bilhete que a mãe lhe leu:

   Lamento! Tive de ajudar o teu gato a partir sem sofrer demasiado… Foi pena, mas era melhor para ele. Quando quiseres...

   Até breve, Laura!

   Sérgio

   Laura ouviu a mãe falar a sério de eutanásia, de injecção, e concluir por fim:

   — Tens um amigo novo. Sérgio é um nome estranho, que me faz pensar no tecido do casaco que eu usava quando tinha a tua idade e que...

   Mas Laura não tinha vontade de ouvir as recordações da mãe. Foi chorar sozinha para cima do pequeno muro. Perguntou a si mesma para onde teria Sérgio levado o gato morto. Pareceu-lhe tê-lo visto, cinzento e de pêlo brilhante, escapar-se por entre as ervas altas; bem sabe que foi uma ilusão. Depois, o pintarroxo-que-tinha-medo-do-gato voltou para o terraço e Laura riu-se das suas bicadas ávidas. Saltou rapidamente do seu posto de observação para ir buscar migalhas frescas.

   Junto do pinheiro de Natal, está um presente que dá saltos. Contrariamente ao habitual, a mãe sugere que se abram as prendas de Natal antes da missa do galo. Laura nem quer acreditar. Há muitas coisas a mudar nesta casa, de há uns tempos para cá. Talvez desde que o pai "esteve às portas da morte", como diz a avozinha. Laura ficou a saber que isso significa escapar à morte. Terá ela suspeitado da gravidade do estado de saúde do pai, encontrado desmaiado no jardim enquanto ela estava na escola?

   No entanto, ele está aqui esta noite, o pai, bem vivo e a rir-se, quando a mãe mostra à Laura a prenda que mexe: um gatinho cinzento.

   — Parece filho do gato cinzento. Amanhã vou logo apresentá-lo ao Sérgio.

Colette Nys-Mazure
Contes d’Espérance
Paris, Desclée de Brouwer, 1998
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