Certa vez, um homem encontrou um ganso na praia.
Alguns dias antes, passara por ali a tempestade de Novembro. De certeza que o ganso nadara longe demais, o vento desviara-o e fora mais tarde atirado à terra pelas ondas.
Por ali perto, ninguém tinha gansos, e aquele era um ganso doméstico, branco.
O homem pô-lo debaixo do casaco e levou-o à mulher.
– Aqui está o nosso assado de Natal.
Como nunca tinham tido animais, também não dispunham de nenhum local para o abrigar. Com postes, tábuas e cartão alcatroado, o homem construiu um tabique junto à parede da casa. A mulher pôs sacos lá dentro e, por cima de tudo, uma camisola velha. No canto, colocou um recipiente com água.
– Sabes o que é que os gansos comem? – perguntou ela.
– Não faço ideia – respondeu o marido.
Experimentaram batatas e pão, mas o ganso não tocou em nada. Também não quis arroz nem o resto do bolo de domingo.
– Sente a falta de outros gansos – disse a mulher.
O ganso não se debateu quando o levaram para a cozinha. Ficou quieto debaixo da mesa. O marido e a mulher acocoraram-se em frente dele para o animarem.
– Nós não somos gansos! – dizia o homem. Sentou-se na sua cadeira e procurou música no rádio.
A mulher sentara-se à mesa ao seu lado e batia com as agulhas de fazer malha. Era um ambiente muito agradável. De repente, o ganso começou a comer flocos de aveia e um pouco do bolo.
– O nosso querido assado de Natal está a adaptar-se – disse o marido.
Na manhã seguinte, já o ganso andava pela casa toda. Enfiava o pescoço nas portas abertas, debicou as cortinas e sujou o tapete da entrada.
A casa onde o marido e a mulher viviam era simples. Não tinha água canalizada, só uma bomba. Quando o homem enchia um balde com água da bomba, como fazia todas as manhãs antes de ir para o trabalho, o ganso vinha, subia para o balde e tomava banho. A água transbordava e o homem tinha de voltar a dar à bomba.
No jardim, havia uma casinha de madeira, que era o quarto de banho. Quando a mulher lá ia, o ganso corria atrás dela e fazia força para entrar. Mais tarde, até começara a acompanhá-la à padaria e à leitaria.
Quando, à tarde, após o trabalho, o homem regressava a casa de bicicleta, a mulher e o ganso esperavam-no à porta do jardim.
– Agora também já gosta de batatas – contava a mulher.
– Que lindo que ele é! – dizia o marido, fazendo uma festa na cabeça do ganso. – Assim, até ao Natal, vai ficar redondo e gordinho.
O tabique nunca foi usado porque o ganso ficava todas as noites na cozinha aquecida. Comia cada vez mais. Às vezes, a mulher punha-o em cima da balança e de cada vez ele pesava mais.
Quando, à noite, o marido e a mulher jantavam, punham-se a imaginar os pratos de Natal mais suculentos.
– Ganso assado com couve roxa combina bem – dizia a mulher, coçando a cabeça do ganso, ao seu colo.
O homem preferia choucroute em vez de couve roxa, mas o mais importante para ele eram os bolinhos de batata.
– Têm de ser tão grandes como o meu punho e todos do mesmo tamanho – dizia.
– E feitos de batata crua – acrescentava a mulher.
– Não, de batata cozida – opinava o marido. Depois, acabavam por se pôr de acordo: metade de batata cozida, metade de batata crua.
Quando iam para a cama, o ganso deitava-se-lhes aos pés e aquecia-lhos.
O Natal chegou de repente.
A mulher enfeitou uma pequena árvore de Natal, o marido pedalou até ao merceeiro e trouxe tudo de que precisavam para a ceia. Trouxe ainda um quilo de flocos de aveia extrafinos.
– Embora seja o seu último Natal, quero, ao menos que saiba o que é – suspirou.
– O que eu queria perguntar – disse a mulher – era como achas tu que vamos… quero dizer… que devíamos…
Mas não continuou.
Por um momento, o marido nada disse e, de seguida:
– Eu não consigo.
– Eu também não – disse a mulher. – Se fosse um ganso qualquer, sim, mas logo este… Não, não sou capaz.
O marido pegou no ganso e prendeu-o no cesto da bicicleta. Em seguida foi ao vizinho. Entretanto, a mulher preparou a couve roxa e fez os bolinhos de batata, todos exactamente do mesmo tamanho.
O vizinho morava relativamente afastado, mas não tanto que fosse preciso um dia inteiro de viagem. Apesar disso, o marido só regressou à noite, o ganso tranquilamente sentado atrás dele.
– Não encontrei o vizinho em casa, por isso fomos dar uma volta de bicicleta – disse ele embaraçado.
– Não faz mal! – exclamou a mulher, animada. – Quando saíste, fiquei a pensar que se tiver outra coisa a acompanhar, a couve roxa com bolinhos não sabe bem.
A mulher tinha razão e fizera um bom jantar. O ganso comeu aos seus pés os flocos de aveia extra-finos. Mais tarde, sentaram-se os três no sofá a olharem para as luzes das velas.
Aliás, no ano seguinte, para variar, a mulher fez choucroute para acompanhar os bolinhos. E dois anos depois, houve massa a acompanhar a choucroute. É que são pratos tão bons, que nem devem ter qualquer acompanhamento.
Entretanto, já se passou bastante tempo, e os gansos vão envelhecendo.
Margret Rettich
Anne Braun (org.)
Weihnachtsgeschichten
Würzburg, Arena Verlag, 1991
Tradução e adaptação