Sete em cada dez crianças portuguesas que urinam involuntariamente durante o sono nunca receberam apoio médico, apesar deste problema poder ser ultrapassado com medidas simples, revela um estudo inédito a que a Lusa teve hoje acesso.
Este estudo, que envolveu 15 hospitais da região norte, foi o primeiro do género realizado em Portugal para avaliar a prevalência da enurese nocturna em alunos do ensino básico, doença que se estima que atinja 80 mil crianças portuguesas dos cinco aos 14 anos.
Os resultados desta investigação, que decorreu entre Janeiro e Outubro de 2006, apontam para uma prevalência global de enurese nocturna de 6,9 por cento, sendo mais elevada entre os rapazes (9,4) do que entre as raparigas (4,3).
O estudo refere ainda que, apesar da enurese nocturna primária ser considerada a segunda disfunção física com maior incidência na infância, atrás das alergias, apenas metade das crianças com este problema foi levada ao médico e somente um terço recebeu algum tipo de tratamento.
Outra conclusão significativa é que a doença é mais frequente nos alunos com pior rendimento escolar e maiores dificuldades de aprendizagem (14,6 por cento) do que entre os melhores alunos (7,3 por cento).
As conclusões resultam de 2.104 inquéritos preenchidos por encarregados de educação, tendo 41 por cento considerado que o facto dos filhos sofrerem deste problema afecta a sua vida familiar, social e escolar.
Este estudo permitiu ainda concluir que existe uma elevada falta de informação dos pais relativamente a esta doença, que se reflecte no facto de 31 por cento das crianças que sofrem de enurese nocturna dormirem com fralda.
Os especialistas rejeitam esta medida, considerando que o uso da fralda durante o sono pode implicar um retrocesso na criança.
A enurese nocturna afecta a auto-estima e a socialização das crianças, pelo que o facto de não ser tratada pode ter consequências negativas no desenvolvimento e causar problemas psicológicos para toda a vida.
Apesar de ser frequente pensar-se que o problema se resolve com o tempo, os especialistas consideram importante realizar tratamento o mais rapidamente possível, para prevenir o sofrimento da criança.
Nesse sentido, a criança deve ser levada ao médico logo que apareçam os primeiros sintomas de alerta, sendo um dos mais importantes o facto da criança continuar a urinar na cama depois de entrar para a escola.
Deve ser também dada especial atenção a situações como o nascimento de um irmão ou o divórcio dos pais, que podem originar episódios temporários de enurese.
Por outro lado, a doença tem uma grande prevalência hereditária, existindo um índice de ocorrência de 44 por cento nos casos em que um dos pais foi enurético e de 77 por cento se ambos os pais tiveram a doença, pelo que este factor também deve ser tido em atenção.
A enurese tem como causa fisiológica mais comum uma deficiência na produção nocturna de uma hormona antidiurética denominada vasopressina, que regula a produção de urina, mas também há casos com origem psicológica, especialmente quando a criança que urina na cama se apercebe que tem mais atenção dos pais.
Perante a enurese dos filhos, os especialistas alertam que é importante estar consciente de que a culpa não é da criança, nem dos pais.
Por essa razão, castigar a criança não só não resolve o problema, como o poderá agravar, pelo que o mais importante é apoiar os seus esforços para ultrapassar o problema e procurar ajuda médica com a maior brevidade possível.
Os principais conselhos passam por conversar com a criança sobre o problema, fazê-la ir à casa de banho antes de adormecer e a deixar não beber demasiados líquidos durante a noite.
Actualmente estão disponíveis consultas de enurese nocturna em duas dezenas de hospitais portugueses, entre os quais Barcelos, Braga, Coimbra, Covilhã, Guimarães, Matosinhos, Oliveira de Azeméis, Paredes e Porto.
Estas consultas também existem nos hospitais da Póvoa de Varzim, Santa Maria da Feira, Gaia, Abrantes, Almada, Amadora, Leiria, Lisboa, Santarém, Tomar, Torres Novas e Torres Vedras.